terça-feira, agosto 19, 2014

Nefro

Entraste insegura, trémula. Os passos eram curtos e incertos.
Mas a porta tinha-te sido aberta, não vinhas só. Contigo, a amparar-te a cada passo vinha ele.
Sentaste-te. Ele optou por ficar calmo, em pé. A teu lado, ia compassadamente apertando a tua mão, afagando-te o cabelo.
Tinhas nos olhos enormes, um cansaço típico da tua condição. Ele nos seus, igualmente expressivos, toda a atenção e vontade de sorver toda a informação que fosse sendo vertida. E que rapidamente tentava transformar numa espécie de tentativa de plano de cura.
Ambos novos, nos seus 30. Ela com uma sentença de doença crónica, e um curso a tender para o dramático. Teria tudo para parecer a vítima numa história. Mas olhando bem para aquele amor. Aquele afecto genuíno. Aquela união. Ela sim era a pessoa mais abençoada daquele consultório.
Nem todos teremos a certeza de ter ao nosso lado alguém disposto a tudo, para o nosso bem. Disponível para abdicar de tempo, de vida própria, de si, porque só com aquela pessoa a vida faz sentido, mesmo que num trilho complicado, mesmo sem a feliz ingenuidade do fim.
Naquele momento, soube que independentemente das nossas dispares condições de saúde. Apesar de parecer que não... nós éramos as pessoas a necessitar de alguma intervenção e ajuda. Porque tu, menina dos olhos grandes e cansados, podes ter a certeza que tens toda a felicidade do mundo.

Um comentário:

Balhau disse...

Até dá vontade de ficar doente! :D