terça-feira, fevereiro 19, 2013

"Família D" - Apresentação


Não consigo precisar como fui percorrer esse caminho mental que me levou a ela. Mas dei por mim embrenhada num exaustivo processo de recrutamento de memórias. Memórias longínquas e que nem sabia que conseguia invocar com tamanha precisão.
Reparei, no entretanto, que não havia nunca feito qualquer referência à matriarca, nem tampouco a essa família. Não me espanta. Demorei algum tempo a ver claramente as pessoas que estavam por detrás de toda a farsa de família íntegra, era então demasiado nova para querer ver o quão enganadoras as pessoas podem ser.

Vista de longe, parecia a família perfeita. Pessoas cultas, educadas, estáveis na vida... em suma, o protótipo  que vemos no ecrã, no típico filme de sábado à tarde e que nos é vendido como "a" família.
No entanto, à medida que nos aproximamos reparamos que o verniz luzidio que ao longe nos parecia impecável, está completamente estalado e marcado por profundas frinchas. Cada frincha aberta por uma pequena, ou nem tão pequena, mentira. E vista de perto, verificamos que os laços que habitualmente unem elementos, foram neste caso substituídos por uma emaranhada teia de interesses e colada com mentiras.
São três os elementos da teia. Todos eles contribuem largamente para o caos. Nenhum gosta do núcleo a que pertence, mas nunca o abandonaria, porque há que trabalhar para manter essa que é a missão grupal: alimentar a imagem de família perfeita. Para isso, ignoram-se traições de anos, mentiras inacreditáveis, jogos de interesses, ódio mútuo. Tudo vale, para o fim que se deseja.
O 3º elemento, fruto da relação dos dois primeiros, cedo aprendeu as regras do jogo. E em última análise sabe que não interessa a verdade dos factos, mas sim a verdade que conseguimos vender. Se um cenário for suficientemente bom para ser credível ao mundo, então, é verdadeiro. Esta é a filosofia base do clã D. E é a premissa que nunca será abandonada.
Tive o infortúnio de ser no curso dos dias levada ao clã. Partilhei espaço, refeições, mas mais que isso, cega pela minha inocência, partilhei a minha preciosa confiança. Por pouco não fui engolida por eles. Mas como toda a mentira tem perna curta, cada mentira, traição da teia foi sendo meticulosamente descoberta e esclarecida por mim. Quis ter a certeza que não estava a ser profundamente injusta. Hoje sei que o dia em que virei as costas ao clã D, foi o dia em que me salvei de morrer asfixiada pela teia deles. Sei igualmente que nem todos tiveram a minha sorte. Lamento-o. Ou talvez não. Porque pessoas há com igual espírito, que tudo fazem para alimentar a fachada de vida perfeita. Desculpa-me Lady P se te sou injusta. Porém, não te conheço e como tal quero dar-te esse benefício da dúvida. Se como eu és apenas mais alguém inocentemente levada a confiar no que nos é contado, faz-te um favor: abre os olhos e liberta-te!

Depois destes anos passados, continuo a sentir um grande aperto no meu interior quando penso no clã, hoje diminuído. Porque apesar de tudo, custa acordar para a realidade de um mundo onde existem pessoas capazes de ludibriar tudo, e todos, pelo tempo que lhes seja possível.
Clã D, lamento muito ter-vos conhecido. De vós, mais não quero do que o resto dos meus dias de distanciamento.


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